Congruência e Liderança

31 - 01 - 2022

Artigo escrito por: Vitor Mota

O valor da congruência é subestimado dentro das organizações, empresariais ou outras, e muitas vezes, em consequência, os resultados ficam aquém do pretendido.

A congruência é mais percepcionada do que percebida.

Não precisamos olhar com muita atenção para perceber que, os que chamamos de líderes, sejam políticos ou politólogos, opinion makers socias, directores e treinadores desportivos, empresários e presidentes associativos, todos disponibilizam tempo, “em horário nobre”, para a comunicação.

Significa que, comunicar merece atenção?!?!
Tempos a tempos, damos por nós a sentirmo-nos desconfortáveis com o que estamos a ouvir; não porque a língua ou o assunto seja estranho, mas porque algo no discurso não “bate certo”. Serão as palavras? Serão as posturas? Serão ambas? Estarão a dizer algo com palavras e algo diferente com a atitude? Esta falta de congruência é tão perceptível pelas pessoas e, apesar disso, os “Comunicadores” esquecem-se de lhe dar a devida atenção.
É claro que precisamos ser empáticos na comunicação, mas isso não pode ser desculpa para falar apenas o que o ouvinte gostaria. Ser “politicamente correcto” sem pensar no resultado adiante? Para si mesmo? Para o seu interlocutor? Ou, ainda mais grave, para a empresa ou para o país? Peter Drucker dizia que “a coisa mais importante na comunicação é ouvir o que não é dito”, ou seja, para além de atender aos elementos “formais” das palavras e expressões, a linguagem não verbal e a congruência são entendidas; e isso tem um impacto bastante grande. E das acções subsequentes? O que vemos são acções em linha com o que foi afirmado? Uma pessoa amiga diz com frequência que “o que fazemos fala tão alto, que o que dizemos ninguém ouve!” e isso demonstra a importância das acções e do respectivo alinhamento com o discurso. Quando acontece um desalinhamento entre mensagem, verbal ou escrita, e a acção, a maior atenção do receptor vai para as acções, o que implica que o colaborador na empresa assemelhe o seu comportamento ao que viu acontecer; o cidadão tenda a fazer o que o governante fez; o filho a copiar o pai.
Acontece ainda, não raramente, que anunciado um objectivo macro ou estratégico a perseguir, alguns dias, semanas ou meses depois é tomada uma decisão “desviante” em relação ao previamente definido. As circunstâncias alteraram? Terá sido o objectivo? Porquê a mudança? Foi comunicada frontalmente? Foi explicada a quem e como vai afectar? Por vezes, esta mudança “conflitua” com algo feito recentemente, sem alteração de circunstâncias, sem pré-avisos ou comunicados. Claro que surge a surpresa, grande, e logo vem o “povo” e vaticina “faz o que eu digo e não o que eu faço!” em modo sarcasmo.
O pior desta incongruência é os liderados perderem a confiança em quem lidera. Seja a que nível for, dentro ou fora das empresas, na vida social e política; pode ainda ser agravado pela falta de consequência das acções, em qualquer dos cenários.
Parafraseando o próximo arcebispo de Braga, Dr. José Cordeiro, a congruência é como o sinal da cruz, ou seja, concordância absoluta entre o que se pensa, o que se sente e o que se faz! Como sabemos, não há liderança sem confiança no Líder e do Líder na equipa; e se incongruência gera desconfiança, podemos afirmar com segurança que, não há Liderança sem Congruência. E em que se apoia a congruência? Como a podemos fundamentar? A congruência funciona através da lógica de pensamentos. Pensar azul hoje e verde amanhã, pode ser, se as razões para isso forem visíveis ou sustentáveis e não apenas porque sim, porque me apetece, hoje.

A congruência percebe-se na coerência das várias acções e decisões, que alinham num mesmo sentido, concorrem para um mesmo ponto, o objectivo previamente definido e comunicado de forma estruturada e lógica. A congruência flui na harmonia entre intuição e emoção, despertas com o pensamento nos resultados interligados das decisões para as acções, e vice-versa, com energia mas sem necessidade de esforço. A congruência encaixa na uniformidade de critérios, de análise e de valores, que foram tidos em conta para a tomada de decisão, e esta é mantida de modo consistente até ao resultado que foi proposto alcançar, com nexo causal entre origem e destino, entre razões, estratégias e objectivos, de um modo consistente. E que tipo de resultados podemos esperar? Tudo começa na confiança. É aqui que nos apercebemos da mudança estrutural das relações entre os elementos do grupo, dos cidadãos ou dos colaboradores, que pensam no colectivo mais que no individual, no contributo mais que na recompensa. A coesão aparece inabalável. A ligação acontece biunívoca, em harmonia de pensamentos, sentimentos e movimentos com vista ao objectivo proposto e cada operação é parte da “missão” de grupo, sustentada na visão macro e de modo integrado na agregação de valor. A simultaneidade de esforços, ideias e movimentos, como se de uma única entidade de tratasse, em plena igualdade corpórea e numa sintonia idêntica à orquestra mais afinada.
Acontece diariamente a vontade de integrar, interagir e adicionar, desde o mais pequeno esforço ao maior saber, contributo motivado pelo “eu” alinhado na solução, para um valor final acrescido. Há concordância de emoções e sentimentos que resulta no sucesso colectivo, de qualidade superior ao pré-estabelecido ou solicitado, de modo consistente.



“Trust is congruence between what you say and what you do.”

Peter Drucker A elaboração deste artigo recorre às regras de escrita anteriores às do actual acordo ortográfico.